quinta-feira, 20 de junho de 2013

Corpo, voz e mente (parte II)

O ator e o diretor de cinema na construção do personagem


No cinema, posso ver tudo de perto, e bem visto, ampliado na tela, de modo a surpreender detalhes no fluxo do acontecimento dos gestos (...) para que o espetáculo do mundo se faça para mim com clareza, dramaticidade e beleza.

Ismail Xavier


Com seu surgimento nas experiências de pioneiros como Louis Lumiére, o cinema registrava a vida e o habitual. Pessoas comuns, operários de uma fábrica, chegadas e partidas em uma estação ferroviária.  Cenas cotidianas que impressionavam os espectadores pelo fato de estarem registradas, mas não demorou a que se começasse a explorar o potencial ficcional que esta arte permitia.
 Assim, como no teatro, o cinema começava a se exibir através das faces daqueles que dedicam sua vida à arte da interpretação. No entanto, o ator teve de se adaptar, transformar seus gestos expressivos e grandiosos que tinham como único fim o olhar de sua plateia, para gestos que se tornariam recortados pelos olhos da câmera. Ismail Xavier, teórico e professor de cinema brasileiro, em sua obra "Olhar e a Cena" diz que:

"Com o cinema, a percepção humana ganhou um acesso especial à
intimidade dos processos - nele, a aparência é já uma análise. O close-up não é
o lugar do fingimento, é uma presença que revela o que se é, não o que se
pretender ser (inúteis as caretas dos atores)."

O plano close up, ou simplesmente close, é caracterizado pelo enquadramento de câmera fechado em um único assunto ao qual se quer chamar atenção, usualmente o rosto de uma pessoa. Este é sem dúvida o enquadramento que mais expõe um ator em cena, a escolha destes cortes, assim como do desenvolvimento do personagem é dada pelas mãos do diretor.
Para Luciano Coelho, cineasta curitibano e coordenador do projeto de pesquisa audiovisual Olho Vivo, a criação de um personagem no cinema se dá pelo desenvolvimento das cenas, que foram definidas no roteiro e também no trabalho entre diretor e ator. “Eu acho que o personagem começa a ser criado no roteiro, e termina de ser construído, tanto pela maneira que o diretor encara esse personagem, como também na maneira como o diretor ajuda o ator a construir o personagem”, explica.

Sobre este processo de construção do personagem, o ator  paulistano Horley Lopes, que atuou no curta “Irreversível” e em várias publicidades, separa os diretores em dois gêneros: “Existem diretores pacíficos e outros com o personagem já pront9o em sua mente. Quando ele é pacífico você cria da sua forma e ele só faz alguns ajustes. Agora, quando ele quer o personagem da sua forma, ele vai te repassando e você vai criando, e ele vai moldando”.


Anne Hathaway em "Os Miseráveis": o close é imperceptível

Extrair do ator as emoções competentes a cada cena e leva-lo a perceber os objetivos de cada momento dentro da história são alguns dos desafios do diretor, a forma de se fazer isso varia com cada profissional. Para Coelho, o diretor irá lidar com seus atores de acordo com a junção de seus estudos e também da forma como ele interage com os outros no seu dia a dia. “Um diretor não deixa de ser quem ele é quando ele lida com os atores, a forma que você lida com as pessoas é como você vai falar com os seus atores. A direção do ator é um fruto do estudo e das relações humanas,  nós aprendemos a lidar com o ser humano no dia a dia, saber como ele funciona. E acabamos levando isso para o processo de preparação de atores e para a direção no set”.

O teórico Imail Xavier, em uma palestra realizada no Museu de Arte Moderna no Rio de Janeiro apresenta essa importância do diretor na colocação de significados para os atores, pois apenas desta forma seria possível uma atuação que realmente tivesse sentido. “Desde que a câmera esteja presente as pessoas fazem teatro, ou seja, desde que a câmera esteja presente representamos algo, deixando de ser um mero registro e tornando-se cena”, diz. Horley Lopes vê como uma das maiores dificuldades na atuação a falta de conexão com o personagem. “As grandes dificuldades são quando ele (o personagem) é muito diferente de você, pois sair e voltar ao seu cotidiano todo dia é difícil, mas enquanto não há conhecimento de verdade sobre o personagem, será muito mais complicado. Agora, quando você tem conhecimento da ideia do diretor e toma conhecimento do personagem, se torna tudo mais fácil...”.

Uma Thurman e Quentin Tarantino no set de "Kill Bill vol. 1"

No cinema, um obstáculo para os atores é a ordem das gravações, que dificilmente se dá de forma cronológica. “É comum no primeiro dia filmar uma cena do final do filme e aí o começo você vai fazer lá no final das filmagens, então pelas filmagens serem muito picotadas o ator precisa saber exatamente qual o estado de espírito do personagem naquela cena que ele vai filmar no dia tal”, explica Luciano Coelho. O cineasta também destaca a fragilidade de usar o próprio corpo para criação, já que muitas vezes ficamos desconfortáveis com nosso próprio corpo. “Imagine quando você escuta sua voz em um gravador, e diz: que voz horrorosa, essa não pode ser minha voz. O ator tem que aprender a trabalhar com isso. O ator cumprindo o seu papel de interpretação é um ser muito frágil, o diretor precisa ser a referência do ator para aquilo que ele está fazendo, porque ele usa a própria imagem a própria voz, com os seus gestos, então ele está em um constante estado de fragilidade”, completa.


Texto: Hellen Albuquerque
Reportagem: Natalia Concentino e Eva Manzana
Edição de imagens: Isabela Bandeira

1 comentários:

yevgenijdagnan disse...

Top Casino in New York City | Mapyro
The best place to play slots & table games, 여주 출장마사지 get 밀양 출장샵 directions, reviews and information for your favorite slot 통영 출장마사지 machines and table games. Find 삼척 출장샵 the best 안동 출장샵 odds.

Postar um comentário