quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Quem são Os Miseráveis?

Como a identidade cultural influencia na recepção da crítica e na visão do espectador   


Após uma década sem indicações ao Oscar de melhor filme, os musicais voltaram em cena com o espetáculo de Claude-Michel Shöenberg e Alain Boublil transformado em ópera pela WEST END, (Londres- 1985) metamorfoseado no filme Os Miseráveis, que despertou diferentes opiniões dos críticos. O clássico escrito por Victor Hugo em 1862, agora adaptado por Tom Hooper, não despertou grande interesse no Brasil, seja na mídia impressa ou online, há pouco espaço para comentários, alguns deles chegam a ser totalmente informais. A maioria é negativa, criticando principalmente o longo tempo de duração do filme, os diálogos que são cantados sem grandes intervalos. Andre Barcinski, no site da Folha de S. Paulo, descreveu Os Miseráveis como "a comédia do ano", achando-o "desagradável”,"torturante" e "ridículo". 
 Em entrevista, o fundador da Academia de Artes Cênicas Cena Hum de Curitiba-PR, George Sada, diz que o que mais chamou a atenção foi o status social marcado no figurino, voltando sua atenção para a produção técnica. “Pra muita gente pode ter sido cansativo, mas o filme foi um musical do início ao fim, foi transportado para as telas e isso é uma riqueza de linguagem artística”. 

Assim como brasileiros, os norte americanos concentram suas análises nas escolhas do diretor em relação a parte artística. Lou Menick (New York Post), aponta como falha a filmagem, “o pior de tudo é quando Hooper repetidamente prende seus atores em apertados closes durante os números musicais, praticamente empurrando a câmera nos cantores” (tradução livre). Manohla Dargis (New York Times) destaca o cuidado com a direção de arte, afirma que o filme retoma um aspecto familiar e histórico contando uma lenda de redenção e liberdade. Para a socióloga Rosita Loyola, ao mostrar a busca pela liberdade, o filme traz à tona um dos ideais mais antigos e presentes na cultura americana. “Eles (os americanos) acreditam na idéia de liberdade acima de tudo e isso está presente no filme, mas talvez por não ser uma história que aconteceu nos Estados Unidos, não tenha tido tanta expressividade na premiação do Oscar”. Rosita afirma que a identidade cultural de um povo se faz presente ao assistir um filme, e que o espectador gosta de ver ideais e contextos com os quais se identifica. É notável a diferença de recepção de acordo com o local de origem da critica, enquanto norte americanos e brasileiros focam suas atenções a parte técnica e de produção, europeus se preocupam em como a história que lhes diz respeito foi retratada. 

A identidade cultural e histórica dos franceses em relação a este fato é mais marcante do que a de qualquer observador externo. Em relação aos franceses, Rosita Loyola comenta que eles se identificam muito com o heroísmo, por isso as críticas focaram na representação da obra de Victor Hugo. De acordo com os franceses, a diferença entre ricos e pobres no século XIX e a força da Revolução Francesa, que são os assuntos de destaque abordados por Victor Hugo em sua criação original, são representados no filme de forma superficial e as músicas não tiveram o tamanho que mereciam. O site francês EcranLarge , por exemplo, classificou como um desastre do início ao fim o filme de Tom Hooper. “Fere os olhos e faz sangrar os ouvidos. 02h30min de sofrimento salvo (apenas) por Anne Hathaway. Quanto à realização de Tom Hooper, é um desastre do início ao fim”. O crítico italiano Paolo Mereghetti, (Corriere della Sera) afirma que apenas a rebelião dos jovens e a perseguição Valjean X Javert ficam claras no decorrer do filme. “Toda a ambição de Victor Hugo em contar “tudo sobre o bem e o sobre o mal”, se reduz a esses dois focos”, afirma. 



 Conheça um pouco mais sobre a obra Les Misérables de Victor Hugo: 

A obra retrata a França do século XIX, mais especificamente no período entre a Batalha de Waterloo (1815) e os motins de junho de 1832. A vida de Jean Valjean é apresentada desde o momento em que ele, condenado por roubar um pão, consegue sua liberdade até a sua morte. Tudo isso dividido em cinco volumes: I – Fantine, II – Cosette, III – Marius, IV - Idílio da Rua Plumet e epopeia da Rua Saint-Denis e V – Jean Valjean. Cada volume conta também a história de outros personagens, como: Fantine, Cosette, a família Thénardier (o casal e os filhos, entre eles Eponine e Gavroche), Marius Pontmercy, Enjolras e Javert.